terça-feira, 28 de agosto de 2007

Os malucos mais beleza que já conheci

Um homem de comportamento estranho sentou ao meu lado no caminho para casa. Durante o percurso, o homem de pele negra fazia movimentos alternados. Ora puxava os fios do seu cabelo crespo, ora alisava os pelos da sua barbicha já grisalha que restava no queixo. Durante essa oscilação, o homem não parava de abrir e fechar a boca continuamente. Era como se dissesse bababá, sem que se ouvisse os sons, apenas batia o lábio inferior com o superior.

Olhei para ele querendo entender o que fazia, mas com a mão na cabeça, puxando os fios crespos, me olhou e sorriu, com um sorriso demente. Retribui do mesmo modo, com um o sorriso demente.

Essa imagem me remeteu boas lembranças, de períodos que eu vivi rodeada de malucos - devidamente comprovados. Lembrei de alguns loucos que passaram por minha vida e o primeiro, pela ordem cronológica chama-se Jane.

Mesmo com nome feminino, Jane era homem - pelo menos era o que parecia. Jane amedrontava todas as criancinhas de Coqueiros, município de Maragogipe, no recôncavo baiano. Lembro, das férias em Coqueiros e do jeito agressivo de Jane, tão atrapalhado das idéias... O grande problema de Jane era porque atirava pedra nas pessoas.

A segunda experiência manicômica, por assim dizer foi com Nalvinha. Tornei-me amiga dela quando eu tinha 13 anos. Todos a enxotavam e a minha missão todas as manhãs, era levar café preto com pão para ela, que dormia no chão de um bar na frente da minha antiga casa. Consegui entender um pouco de Nalvinha e ela me disse que sua melhor amiga fez macumba para ela perder as idéias e deixar o caminho livre para a traíra roubar seu marido. Nalvinha era uma mulher de corpo suntuoso e com uma inteligência roubada. Me afastei de Nalvinha, num dia em que estava com o juízo nos pés. Em um ataque de fúria, ela se levantou e esmurrou uma amiga que estava ao meu lado, sem motivo algum. Foi uma das primeiras grandes decepções que eu tive com alguém.

Luiz Carlos, mais conhecido como Linho. Linho era o típico louco que te olhava com olhar de maníaco e ria um sorriso apavorante. Puxava também fiapos do cabelo e apertava o queixo e batia a boca. Ainda assim, passei muito tempo conversando com Linho. Descobri que ele ficou louco porque tentou vender suas composições musicais nas rádios e foi barrado pela censura, pois se tratava de letras obscenas. Realmente achava na época que suas músicas não fariam sucesso algum, mas nunca disse isso para ele. Linho pirou. De vez em quando sumia e suas irmãs me diziam que ele estava no hospício. Numa dessas idas, ele não voltou mais. Linho morreu com o sonho de vender músicas, mas foi até bom assim, pois se ouvisse as atuais composições entraria em parafuso de vez.

Por fim Rubinho, um ex-trabalhador do pólo petroquímico, um homem inteligente, endoidou de tanto beber na intenção da sua mulher que fugiu com outro. A dor de corno foi tanta que Rubens estava invariavelmente bêbado. Ele tinha uma mania azucrinante de ranger os dentes, mas mesmo assim, eu gostava do seu papo. Rubens emitia opinião sobre qualquer assunto. Sabia de tudo que estava acontecendo da política até sobre o mais novo feito científico. Mas soube esses dias que Rubinho morreu de tanto apanhar.
Nunca quis ser psiquiatra, não consegui ao menos terminar o Alienista de Machado de Assis, mas sempre me senti atraída por essas pessoas. É uma pena, não ter mais acesso com facilidade a um doido devidamente comprovado, mesmo estando rodeada de gente que falta pouco para comer bosta.
* Milena Brasil